quinta-feira, 26 de abril de 2012



Maioria do STF  já votou a favor das cotas raciais nas universidades


A maioria de seis votos necessária para que o plenário do Supremo Tribunal Federal declare a constitucionalidade da reserva de cotas para negros e demais afrodescendentes em universidades públicas foi atingida, às 17h45 desta quinta-feira, na retomada do julgamento da arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF 186), ajuizada em 2009 pelo DEM, contra a instituição do sistema de cotas raciais pela Universidade de Brasília.
No primeiro dia do julgamento, o ministro-relator Ricardo Lewandowski já tinha rejeitado a arguição, por entender ser “essencial equilibrar os critérios de seleção à universidade para se dar concreção aos objetivos maiores da Constituição”, já que o princípio da igualdade “não pode ser aplicado abstratamente quando é preciso atender aos excluídos”.
O voto de Lewandowski foi acompanhado, até agora, na sessão desta quinta-feira, pelos ministros Luiz Fux, Rosa Weber, Cármen Lúcia, Joaquim Barbosa e Cezar Peluso. Faltam ainda os votos de Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Celso de Mello e do presidente Ayres Britto.
Fux
O ministro Luiz Fux — o primeiro a votar na sessão desta quinta-feira — começou por dizer que a integração étnico-racial na universidade da comunidade afrodescendente suscita dois sentimentos antagônicos: “receio e orgulho”.
Com relação ao “receio fóbico” de que o sistema de cotas estimularia o ódio racial, Fux lembrou que ele sempre existiu desde os anos anteriores à Lei Áurea, quando da Lei do Ventre Livre e da libertação dos escravos idosos. Quanto ao orgulho, ele confessou ter um “caso de amor”, desde 1972, com a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), a primeira do país a instituir as cotas para vestibulandos negros, com “um percentual considerado até desproporcional (40%)”.
Segundo Fux, “a opressão racial dos anos escravocatas deixou cicatrizes no campo da escolaridade”.
“A abolição da escravidão não seguida de políticas como a das cotas nas universidades acabou por atribuir ao negro a culpa pelos seus próprios problemas. Uma coisa é vedar a discriminação racial; outra coisa é implementar políticas que levem à integração social dos afrodescendentes”, na linha de que a verdadeira igualdade é tratar desigualmente os desiguais — afirmou.
O ministro destacou ainda: “Uma sociedade justa e solidária, como exige a Constituição, impõe à sociedade a reparação de danos pretéritos, perpetrados por nossos antepassados”; “o acesso ao ensino segundo as capacidades de cada um (artigo 208 da Constituição) impõe uma exegese que não descure uma interpretação realista da situação dos oriundos da comunidade negra”; “a política das cotas tende ao princípio da solidariedade, com base em uma política racial benigna, que não é discriminatória, até por que defende e promove a ‘raça humana’”.
Rosa Weber
A mais nova ministra da Corte considerou o voto de Fux uma “celebração da vida”, e assentou que a ação tinha de ser julgada à luz da Constituição, que consagra o repúdio ao racismo e o direito universal à educação.
“Liberdade e igualdade andam de mãos dadas; para ser livre é preciso ser igual, e para ser igual é preciso ser livre. Trata-se aqui de igualdade racial, sendo raça uma construção social. Igualdade formal é a igualdade perante a lei; mas é igualdade presumível, que não leva em conta situações ou condições concretas. Não havendo igualdade mínima de possibilidades sociais não há verdadeira liberdade. É preciso que todos os grupos tenham chances equivalentes. Impõe-se assim, às vezes, tratamentos desiguais de pessoas formalmente iguais”, afirmou Rosa Weber.
Ela disse ainda que — mesmo admitindo a tese de que a ausência de negros nas universidades não é consequência de preconceito — 75% da população é composta de pretos e pardos. Ou seja, “de quem não tem as mesmas chances do que os brancos, tendo em vista a sua representatividade na pirâmide social”.
Cármen Lúcia
A ministra Cármen Lúcia resumiu seu voto escrito, destacando que “a igualdade é o princípio mais repetido na Constituição, mas é muitas vezes o mais retórico e o mais esquecido na prática”. Distinguiu “igualdade e igualação”, explicando que “a primeira é estática, enquanto que a igualação é um processo dinâmico”.
Enfatizou a responsabilidade estatal de fazer com que a igualação seja efetivada, com base nos princípios fundamentais do artigo 1º da Constituição. A seu ver, “as ações afirmativas não são a melhor opção, mas constituem um processo, uma etapa, diante de um quadro de igualdade formal, mas não de igualação”.
Joaquim Barbosa
O único ministro negro do STF afirmou que nada tinha a acrescentar ao “excelente e abrangente” voto do ministro-relator, “que esgotou o tema”. Limitou-se a pontuar alguns aspectos da questão, e a pedir ao presidente a juntada do seu voto escrito.
Ele comentou ser a discriminação um “componente indissociável do gênero humano que vem da competição”. E que as ações afirmativas têm como objetivo “quebrar uma dinâmica perversa”, já que os que sempre se beneficiaram das discriminações de que são vítimas os grupos minoritários, naturalmente, a elas se opõem. Acrescentou que “não se deve perder de vista o fato de que a história universal moderna não registra nenhum exemplo de nação que tenha se erguido à condição de potência política mantendo, no plano doméstico, uma política de exclusão”. E concluiu lembrando que já publicou livro e artigos sobre o tema, “não havendo necessidade para me alongar”.
Cezar Peluso
O ministro Peluso também endossou, com algumas observações, o voto “deveras extensivo” do relator. Disse que se concentraria apenas no caráter jurídico constitucional. Ou seja, se o sistema de cotas ofende ou não o princípio de igualdade consagrado na Constituição.
Segundo ele, o sistema é “um experimento que o Estado brasileiro está fazendo” para resolver o problema da dificuldade de acesso,a de alguns grupos étnicos à universidade pública”. 

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